Esse animal compensa a ausência de um escudo protetor externo (uma concha), com um mecanismo diferente de camuflagem, que lhe confere uma coloração verde-esmeralda e o faz ser confundido com folhas. Porém, essa estratégia de disfarce contra predadores é adquirida de uma forma ímpar: através da realização de fotossíntese! Um belo exemplo de design da natureza.
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A lesma do mar, Elysia chlorotica (GOULD), é um curioso molusco que habita as águas da costa leste dos EUA e do Canadá. Esse animal compensa a ausência de um escudo protetor externo (uma concha), com um mecanismo diferente de camuflagem, que lhe confere uma coloração verde-esmeralda e o faz ser confundido com folhas. Porém, essa estratégia de disfarce contra predadores é adquirida de uma forma ímpar: através da realização de fotossíntese!
FOTOSSÍNTESE EM ANIMAIS ???
Pois é, a lesma do mar não só é capaz de se misturar com as algas verdes, como também de captar energia solar para o processo autótrofo.
Com essa peculiaridade a E. chlorotica inovou, desafiando os paradigmas que distinguem os organismos animais e vegetais e deixando os cientistas cheios de interrogações:- O que levaria um animal a realizar a fotossíntese?- Eles se utilizam de comportamento heterotrófico simultaneamente?
- Todos os indivíduos desta espécie são capazes de realizar a fotossíntese?
- Seria essa uma estratégia das algas para não serem predadas?
- Outros animais poderiam passar pelo mesmo processo evolutivo?
Bom, alguns desses questionamentos vêm sendo estudados e decifrados, enquanto outros permanecem inquietando o pensamento dos especialistas.
Sabe-se que a habilidade de realizar fotossíntese da lesma do mar decorre do consumo de sua principal fonte de alimentação, as algas Vaucheria litorea (C. AGARDH). Esse animal, a E. chlorotica, consegue quebrar as células da alga em níveis tão baixos que “rouba” os cloroplastos (cleptoplastia) e os mantêm intracelularmente no epitélio digestivo. Assim, observa-se que o molusco não herda os cloroplastos (processo denominado em genética de transferência vertical), mas, ao contrário, cada nova geração tem que obtê-los através das algas.
O incrível é que os cloroplastos conseguem permanecer funcionais dentro da lesma do mar, participando de um processo denominado endossimbiose, por um período de até 9 meses.
Surgem, então, outras dúvidas:
- Os cloroplastos teriam um grau de autonomia genética e bioquímica tão elevado que conseguiriam realizar sozinhos a fotossíntese ?
- Ou seriam as células hospedeiras as responsáveis pelo fornecimento de proteínas essenciais para o funcionamento desses plastídios ?
Aprofundando-se no assunto, um estudo recente “Horizontal gene transfer of the algal nuclear gene psbO to the photosynthetic sea slug Elysia chlorotica” foi publicado em novembro de 2008 na revista PNAS (vol. 105 nº 46), revelando, através de experimentos na região genômica dos plastídios (ptDNA) da alga V. litorea, que falta aos mesmos o complemento total de genes para a realização da fotossíntese, sendo então necessário que a lesma do mar fornecesse as proteínas para o processo fotossintético.
Mas, como um animal possuiria um gene, típico de organismos autotróficos, relacionado à fotossíntese e responsável pela codificação de proteínas que seriam redirecionadas aos plastídios?
A explicação é que um gene, o psbO, teria sido transferido no passado, por um processo denominado transferência horizontal de genes (HGT), das algas V. litorea para as lesmas do mar E. chlorotica e continuou inserido na linhagem germinativa, mesmo sem a transmissão vertical dos plastídios.
O psbO está presente em organismos autotróficos e é responsável pela codificação da proteína MSP, que tem um papal fundamental processo fotossintético. Agora, esse gene, também localizado no DNA nuclear das Elysia chlorotica, dá suporte a teoria da Transferência Horizontal de Genes (HGT).
A troca de material genético entre dois eucariontes é pouco documentada até a data, sendo a lesma Elysia chlorotica um modelo do potencial da Transferência Horizontal de Genes (HGT) entre dois organismos multicelulares.
O que podemos extrair desses fatos é que o conhecimento não é estável e novos eventos estão sempre surgindo para quebrar com os conceitos e as idéias estabelecidas. Todos os dias a natureza nos surpreende e nos mostra a grande diversidade e beleza que existe, nos desafiando a buscar respostas para entendermos melhor o mundo no qual vivemos.
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